.

.

quinta-feira

Injustiça com talentos brasileiros, um desabafo com sentido e coberto de razão


O Autor do texto publicado em sua rede social é o escrtitor, apresentador e jornalista Thiago Sogayar Bechara.

Quem me conhece sabe sobre minha reticência em assumir uma postura “reclamona”. Prefiro olhar para frente e seguir batalhando, muitas vezes conscientemente iludido até, pois se queixar quase nunca leva a algo produtivo, e ainda cansa os outros. Mas dessa vez, a quem interessar possa, faço valer meu direito de cidadão e produtor cultural para este desabafo que alguns podem ler como protesto e outros como alarme no que se refere à realidade artística e cultural do País. Mais especificamente, refiro-me à dura realidade que enfrentam aqueles que poderiam fazer diferença para o futuro brasileiro e que vivem esbarrando constantemente em empecilhos que vão da má educação de nossas crianças até a imensa dificuldade em conseguir apoios e patrocínios, passando pelo extenso e imbricado rol de interesses políticos e pela ignorância que os mesmos quase sempre encerram (sem generalizações, esteja claro). Entendo, ainda, que seja desnecessária a ponderação de que tais dificuldades têm grande parte de suas origens na mesma deficiência formacional a que me referi, e que isto igualmente atrela-se a questões de ordem ideológica dos que mandam, o que gera a triste imagem de uma bola de neve, em que quem se enrola é o Brasil. Mas isto é – ou deveria ser – o óbvio. Meu intuito neste texto, embora possa pouco, é gritar! Então, com 27 anos de vida e 12 de carreira literária e editorial, depois de 7 livros publicados com sucesso e reconhecidos por grandes veículos de comunicação do País, um programa de TV como apresentador e uma preocupação cada dia maior em se aprimorar e redescobrir, para melhor conhecer e poder melhorar a história da sua pátria, um rapaz de classe média, residente em São Paulo, como eu, enfrenta as dificuldades que eu enfrento diariamente, o que se pode dizer das milhares de pessoas tão ou mais competentes e dedicadas que veem suas sensibilidades e seus talentos represados, ignorados, subestimados, desrespeitados, preteridos e, por fim, tolhidos? Tolhidos por um esquema injusto de valorização dos artistas de um país tão rico neste sentido quanto a Amazônia o é em fauna e flora. Ou talvez mais. E não falo apenas por mim. Ao contrário. Tenho dezenas de amigos e conhecidos, alguns anônimos; outros, notórias e eminentes figuras públicas, nomes fundamentais da nossa dramaturgia moderna, por exemplo, e que se encontram igualmente alijados da patota, impedidos de realizar seus trabalhos, sonhos, contribuições. Gente!
Leis de incentivo na maior parte funcionam por isenção fiscal. O dinheiro não sai do bolso das empresas. O que falta para conseguirmos nossas verbas e realizarmos honestamente as nossas artes? Ah! Esqueci que arte no Brasil é luxo, supérfluo! Que temos questões muito mais sérias, graves, urgentes!, para nos preocupar e que... nunca resolvemos. Pois é. Algo está sendo feito num sentido ou noutro? Vai que a arte ajuda a abrir os olhos, que perigo! Mas ao menos se vive uma democracia (!), ó! Será que eu podia ter dito isso sem me queimar com meus possíveis – não prováveis – apoiadores? Sim, estou falando de dinheiro! Atuar, escrever, cantar, tocar, esculpir, pintar, filmar e ganhar a vida com isso. Então nenhuma dessas e de tantas outras atividades da criação e do espírito podem ser também ofícios regulamentados? Mas voltando às leis de incentivo, o dinheiro que pagaria impostos recebe a autorização legal do governo para ser destinado a projetos culturais. Uau! Sei... Só se for na casa do vizinho, porque na minha os empecilhos burocráticos, limitações percentuais, planejamentos orçamentários, boa vontade da mocinha que cuida dessas questões no setor especializado e interesse real da empresa na contrapartida oferecida (etc.) deixam a amarga certeza de que a grama do quintal ao lado será sempre mais verde. E nós viramos “mendigadores” profissionais, sim, porque essa é a nossa profissão, como se estivessem nos prestando um favor. “Manda o projeto por e-mail”. Para quê?, ninguém responde. Mas não se mendiga só dinheiro, não senhores – minha auto-estima está despencando ao nível da burrice colonizada que ainda nos persegue -, mendiga-se espaço na mídia, mendiga-se uma entrada sem tramoias e jogos de interesse num mestrado de qualidade, mendiga-se o bom senso e a simpatia de editores de casas editoriais de renome. O Brasil tem medo do novo. A meia dúzia de grandes editoras não pode destinar uma parcela maior de seus títulos aos novos autores (não peço amor ao prejuízo, apenas uma margem de ganância um pouco menor – os autores recebem apenas 10% de direitos autorais, tem mais essa!). E o mesmo vale para os demais casos. Se a empresa é muito grande e se para ela a contrapartida é irrisória, então ela prefere continuar pagando para o governo, é claro!, que faz o que com esse dinheiro? Para que destinar a grana a um programa de entrevistas que tem a palavra MEMÓRIA no título e leva para a frente das câmeras nomes como Claudia Alencar, Imara Reis, Elisabeth Hartmann, Tato Fischer, Ruy Castro, Humberto Werneck, Suzy Rêgo, Ana Lucia Torre, Karin Rodrigues, Claudia Mello, Beatriz Segall e tantos outros? Aliás, quem é mesmo Beatriz Segall (ouvi outro dia)? “Manda o vídeo do programa e algumas fotos também!”. Ah, sim! É a Odete Roitman, agora já sei quem é. “Anda sumida, né?”. Não, meu senhor. E ainda que estivesse, se o senhor soubesse o que ela e tantos outros fizeram pela história do Teatro brasileiro, se daria conta de que o Brasil seria muito melhor caso soubesse aprender com os erros e acertos dos seus ídolos. Aliás (novamente aliás!, ui), quem são mesmo os nossos ídolos?

Meus queridos, eu também canto, toco dois instrumentos, aprendo novas linguagens textuais e me aventuro na dramaturgia. Só não me vendo... Não só eu! “Mas tem sexo?”. Entre mim e a gatinha gostosa que não sabe conjugar verbo, com quem eles ficam? Eu também curto a gatinha gostosa. Curto demais! Mas profissionalismo e arte são coisas separadas das nossas ambições sexuais. Ou deveriam ser. Vamos crescer? Até quando vou viver isso? Até quando vou chorar e consolar o choro de quem deu 40 anos de sua vida às telas, palcos, livros brasileiros e hoje mendiga atenção? Se para quem tem nome está difícil, imagina para quem começa agora? 12 anos de carreira: começa agora! Ok! Eu ouvi isso. Vivi tudo isso. Mas tudo bem. Fui preterido, fui negado, ignorado e tratado com soberba por quem não tem a metade da minha atuação e competência. Até aí eu engulo. Mas se isso é eventual é uma coisa. Se vira padrão, é outra. Penso na injustiça que isso constitui, e agora, neste segundo em que escrevo, sem pensar muito já me ocorrem pelo menos vinte casos – parecidos ou piores – que eu poderia exemplificar para dar nome aos bois. Comigo, 21, já é mesmo uma boiada. É isso que se espera de nós. É isso o que não somos. Rebanho. Tangíveis, com viseiras e de preferência que não incomodemos com libelos utópicos que nem sequer serão lidos até o final e que, se forem, e daí?

Alguém responde? Não? Quem se candidata ao e daí?
“Tô” indo para a terapia; quem sabe logo mais eu continue a escrever.